Abaixo está a Viagem de Bran, filho de Febal, e a sua Jornada
Foram cinquenta estrofes que a mulher de terras desconhecidas cantou no chão da casa de Bran, filho de Febal, quando a casa real estava cheia de reis, que não sabiam de onde ela viera, uma vez que a fortaleza estava fechada.
Este é o começo da história. Certo dia, nas vizinhanças de sua fortaleza, Bran caminhava sozinho quando ouviu uma melodia atrás de si. Sempre que olhava para trás, ainda atrás a música continuava. Por fim, ele caiu adormecido com a música, tão suave ela era. Quando despertou do sono, viu perto de si um ramo de prata com flores brancas e não era fácil distinguir as flores do ramo. Bran então levou o ramo em mãos para sua casa real.
Quando as multidões estavam na casa real, viram uma mulher em estranhas vestimentas no chão da casa, e todos podiam vê-la. Foi então que ela cantou as cinquenta estrofes para Bran, enquanto a multidão escutava e todos contemplavam a mulher.
E ela disse:
Um ramo da macieira de Emain
eu trago, como aqueles que sabem,
galhos de branca prata nele estão,
pontas cristalinas com flores.
Há uma ilha distante
ao redor da qual resplandecem os cavalos-marinhos,
uma viagem razoável contra brancas ondas que se erguem,
quatro pilares a sustentam.
Um deleite para os olhos, um lugar glorioso,
é a planície onde a multidão realiza jogos:
currach combate contra carruagem
em Mag Findargat ao sul.
Sob ela, pés de bronze branco
brilhando através de claros séculos.
Terra adorável pela vida do mundo
do qual pendem muitas flores.
Há uma árvore antiga com flores
em que os pássaros cantam as horas:
é em harmonia que é seu costume
cantarem juntos cada hora.
Esplendores de todas cores reluzem
pelas planícies de vozes gentis,
famosa é a alegria, difundida com a música,
em Mag Argatnél no sul.
Deconhecidos são o lamento ou a traição
na bem conhecida terra cultivada,
nada há de rude ou ríspido,
apenas doce música atingindo aos ouvidos.
Sem mágoa, sem tristeza, sem morte,
sem qualquer doença, sem debilidade,
esse é o sinal de Emain,
rara é semelhante maravilha.
Beleza de uma terra extraordinária,
cuja aparência é encantadora,
cuja visão é de um país luminoso,
incomparável é sua névoa.
Então, se Aircthech surgir,
onde pedras-do-dragão e cristais abundam,
o mar atira a onda contra a terra,
fios de cristal caem de suas crinas.
Riquezas, tesouros de toda espécie,
há em Ciuin, de uma beleza viçosa,
ouvindo a doce música,
bebendo o melhor dos vinhos.
Carruagens douradas em Mag Réin,
seguindo o curso do Sol,
carruagens de prata em Mag Mon
e de bronze sem máculas.
Corcéis de pelos dourados na relva lá estão,
outros corcéis de cor vermelha,
outros com lã em suas costas,
azul como a cor do céu.
Dali, na aurora, virá
um brilhante homem iluminando as terras baixas,
ele cavalgará na alva planície banhada pelo mar,
ele agitará o oceano até virar sangue.
Uma multidão virá através do mar claro,
à terra exibirão sua jornada,
eles então remarão para a rocha visível
que se eleva de uma centena de melodias.
Ela cantará uma melodia para a multidão
pelas longas eras, não é triste,
sua música aumenta com os coros de centenas,
eles não buscam nem a decadência, nem a morte.
Emne de muitas formas, próxima ao mar,
esteja perto, esteja longe,
na qual há muitos milhares de mulheres de várias cores
que o claro mar circunda.
Se escutar a música das vozes,
do coral dos pássaros de Imchiuin,
um grupo de mulheres virá de um cume
para a planície de diversões em que ele está.
Virá felicidade junto à riqueza
para a terra onde ressoam as gargalhadas,
para Imchiuin a cada estação
virá a alegria perene.
É um dia de eterno bom tempo
que derrama prata sobre as terras,
um rochedo de puro branco à margem do mar
que recebe seu calor do Sol.
A corrida da multidão ao longo de Mag Mon,
um belo jogo, nada fraco,
na terra de muitas cores, com uma quantidade de beleza,
eles não buscam a decadência, nem a morte.
Ouvindo a música à noite
e no caminho para Ildathach,
o esplendor de uma terra multicolorida, num diadema de beleza,
de onde reluz a branca nuvem.
Há três vezes cinquenta ilhas distantes
no oceano a oeste de nós;
maiores do que a Irlanda duas vezes
ou três vezes é cada uma delas.
Depois de eras, um nascimento ocorrerá,
que não será num lugar elevado,
o filho de uma mulher cujo companheiro não será conhecido,
ele terá o reinado dos muitos milhares.
Um reinado sem início, sem fim,
ele criou o mundo, de modo que é perfeito,
dele são a terra e o mar,
pena daquele sobre qual recaia sua ira!
Foi ele quem fez os céus,
afortunado o que tem um coração claro,
ele abençoará multidões com a água pura,
é ele quem curará tuas doenças.
Não para todos é meu discurso,
embora sua grande maravilha tenha se tornado conhecida:
que Bran escute dentre a multidão do mundo
aquilo de sabedoria que lhe foi dito.
Não caias num leito de indolência,
não permitas que a intoxicação te aflija,
comece uma jornada pelo alvo mar
se desejas alcançar a Terra das Mulheres.
Em seguida, a mulher partiu do seu meio, embora ninguém soubesse de onde ela viera. E ela levou seu ramo consigo. O ramo saltou da mão de Bran para a mão da mulher e não havia forças na mão de Bran para segurá-lo.
Então, no dia seguinte, Bran partiu para o mar. O número de seus homens era três companhias de nove. Um de seus irmãos adotivos e companheiros foi colocado no comando de cada grupo de nove. Quando eles haviam estado no mar por dois dias e duas noites, viram um homem numa carruagem vindo em sua direção pelo mar. Este homem também cantou-lhe trinta estrofes e apresentou-se e disse que era Manannan, o filho de Lir, e disse que deveria ir à Irlanda depois de longos séculos e que um filho seu nasceria, o próprio Mongan, filho de Fiachna – esse era o nome que ele teria.
Assim, cantou-lhe estas trinta estrofes:
Bran julga de uma admirável beleza
em sua currach o mar:
enquanto para mim, em minha carruagem que vem de longe,
é em um campo florido em que ele viaja.
O que é um claro mar
para o leve barco com proa em que Bran está,
é uma feliz campina com profusão de flores
para mim da carruagem de duas rodas.
Bran vê
a quantidade de ondas irrompendo pelo mar límpido:
eu me vejo em Mag Mon
com flores de pétalas vermelhas sem defeito.
Cavalos marinhos resplendem no verão
até onde Bran estende seu olhar:
rios vertem de uma torrente de mel
na terra de Manannan, filho de Lír.
O reflexo do alto-mar onde estás,
Na cor alva do mar onde remas,
amarelo e anil estão espalhados,
é terra e não é ríspida.
O corado salmão salta do ventre
do branco mar para onde olhas:
são novilhos, são cordeiros,
em amizade, sem matança.
Embora um peixe seja visto
em Mag Mell de muitas flores,
há muitos corcéis em sua superfície,
ainda que não vejas.
O tamanho da planície, os números da multidão,
cores resplandecem com glória,
um claro curso de prata, tecidos dourados,
proporcionam bom acolhimento com abundância.
Um belo jogo, totalmente agradável,
eles jogam, sentados sobre a bela grama,
homens e amáveis mulheres sob um arbusto,
sem pecado, sem crime.
Ao longo do alto de uma árvore flutua
teu barco através das alturas,
há uma árvore de belos frutos
sob a proa de tua currach.
Uma árvore com flores e frutos
onde há o verdadeiro perfume do vinho,
uma árvore sem decadência, sem defeitos,
onde há folhas de cor dourada.
Viemos do princípio da criação,
sem velhice, sem a decadência da terra,
por isso não esperamos que haja fraqueza,
o pecado não veio a nós.
Um mau dia em que a Serpente chegou
ao pai em sua cidade!
Ela perverteu os tempos neste mundo,
assim veio a dissolução, que não lhe era original.
Pela ganância e luxúria ela nos trouxe a morte,
Por meio dos quais ela arruinou sua nobre raça:
O corpo sem vida partiu para o lar do tormento
E eterna morada da tortura.
É uma lei do orgulho neste mundo
acreditar nas criaturas, esquecer a Deus,
a destruição por doenças e velhice,
a devastação da alma pela ilusão.
Uma nobre salvação virá
do Rei que nos criou,
uma clara lei virá pelos mares;
além de ser Deus, ele será homem.
Esta forma que tu vês
irá a tuas terras;
cabe-me viajar à casa dela,
à mulher em Line-Mag.
Pois é Manannan, filho de Lír,
da carruagem na forma de homem,
sua descendência virá em curto tempo
um brilhante homem num corpo de branca argila.
Manannan, o filho de Lír, será
um digno companheiro de cama para Caintigern:
ele conceberá seu filho no belo mundo,
Fiachna o reconhecerá como seu filho.
Ele será o deleite dos habitantes do Síd,
será o predileto de cada terra agradável,
tornará conhecidos os segredos – uma rota de sabedoria –
do mundo, sem ser temido.
Ele terá a forma de cada animal,
no mar azul e na terra.
Será um dragão perante exércitos na batalha,
será um lobo de toda grande floresta.
Será um cervo com chifres de prata,
na terra onde carruagens são conduzidas,
será um salmão salpicado num lago cheio,
será uma foca, será um branco cisne brilhante.
Ele atravessará longos séculos
e centenas de anos em bela realeza,
ele derrotará batalhões – uma sepultura perene -,
ele tornará rubros os escudos, uma roda na estrada.
Estará próximo a reis com um campeão,
ele será conhecido como valente herói,
nas fortalezas de uma terra elevada
De Inslay enviarei um fim estabelecido.
No alto eu o colocarei com príncipes,
ele será superado por um filho do engano;
Manannan, filho de Lír,
será seu pai, seu mentor.
Ele estará – curto será seu tempo –
Por cinquenta anos neste mundo:
uma pedra-do-dragão do mar o matará
em batalha em Sen Labor.
Ele pedirá uma bebida de Loch Ló,
enquanto olha a torrente de sangue,
a branca multidão o levará, sob uma roda de nuvens,
para a assembleia onde não há tristeza.
Rápido, então, que Bran reme,
não longe da Terra das Mulheres,
Emain, com nuances de hospitalidade
alcançarás antes do anoitecer.
Logo após, Bran o deixou. E ele viu uma ilha. Remou em volta dela e uma grande multidão os olhava pasmada e rindo. Estavam todos olhando para Bran e seus companheiros, mas não paravam para conversar com eles. Continuavam a explodir em risos diante deles. Bran enviou um dos seus homens à ilha. Ele se juntou aos outros e ficou rindo como os outros homens da ilha. Ele continuou a remar ao redor da ilha. Sempre que seu companheiro passava por Bran, seus companheiros o chamavam. Mas ele não conversava com eles, somente os olhava e ficava gargalhando. O nome dessa Ilha é Ilha da Alegria. Após isso, deixaram-no ali.
Não muito depois, chegaram à Terra das Mulheres. Viram a líder das mulheres no porto. Disse a líder das mulheres: “Venha até aqui, ó Bran, filho de Febal, bem-vinda é tua chegada!” Bran não se aventurou a ir até a margem. A mulher lançou um novelo de fio bem no rosto de Bran. Bran segurou a bola com a sua mão, e ela grudou na palma. O fio da bola estava na mão da mulher e ela puxou o barco em direção ao porto. Então, eles entraram numa casa grande, onde havia uma cama para cada casal, três vezes nove camas. A comida que era colocada em cada prato não desaparecia dele. Parecia-lhes que havia um ano que estavam ali – ocorre que eram muitos anos. Nenhum gosto lhes faltava.
O desejo pela sua terra tomou a um deles, o próprio Nechtan, filho de Collbran. Seus parceiros insistiram em pedir a Bran que voltasse à terra da Irlanda com eles. A mulher disse que sua partida lhes traria arrependimento. Entretanto, eles foram e a mulher disse que nenhum deles deveria tocar a terra e que eles deveriam resgatar o homem que haviam deixado na Ilha da Alegria.
Então, eles viajaram até chegarem a uma aglomeração de pessoas em Srub Brain. Os homens lhes perguntaram quem vinha pelo mar. Disse Bran: “Sou Bran, filho de Febal”, falou ele. Porém, os outros responderam: “Não conhecemos esse homem, mas a Viagem de Bran está em nossos antigos relatos.”
Nechtan então saltou do barco onde estavam. Assim que tocou a terra da Irlanda, imediatamente s transformou em um monte de cinzas, como se tivesse estado na terra por muitas centenas de anos.
Para o filho de Collbran, foi grande a tolice
de levantar sua mão contra o tempo,
sem ninguém para lançar uma onda de pura água
sobre Nechtan, filho de Collbran.
Depois disso, Bran contou todas as suas aventuras às pessoas na aglomeração, desde o começo até aquele momento. E ele escreveu essas estrofes em Ogham e disse-lhes adeus. E, a partir desse momento, seus caminhos são desconhecidos.